As férias de verão são, geralmente, associadas ao descanso, lazer e convívio. No entanto, para muitos, este período pode representar uma rutura abrupta nas rotinas sociais, conduzindo ao aumento do sentimento de solidão e desconexão emocional. Grupos como idosos ou trabalhadores e estudantes deslocados podem sentir a ausência do contacto regular com colegas, professores ou amigos, o que acentua a vulnerabilidade emocional. A pressão social para "aproveitar as férias ao máximo" contribui para um desfasamento entre as expectativas idealizadas e a realidade experienciada, intensificando o sentimento de exclusão. A Ordem dos Psicólogos Portugueses (2022) alerta que a solidão tem implicações sérias na saúde mental, incluindo o aumento do risco de depressão, ansiedade, stress, dificuldades de autoestima e perturbações do sono.

A solidão é, essencialmente, uma experiência subjetiva de desconexão emocional, que não depende da presença física de outras pessoas. Richardson, Elliot e Roberts (2017) definiram-na como “perceção subjetiva de deficiências na rede de relações sociais” (p. 1). Este entendimento apoia o modelo da discrepância cognitiva, segundo o qual a solidão emerge quando existe um desfasamento entre as relações desejadas e as vividas. Por oposição, estar sozinho pode ser uma escolha saudável e necessária para a introspeção e o descanso, enquanto a solidão indesejada está relacionada com sofrimento emocional.

Durante o verão, diversos fatores específicos agravam o risco de solidão. A suspensão das rotinas escolares e laborais reduzem as oportunidades de contacto humano, fomentando a desconexão emocional. Paralelamente, a exposição intensiva a redes sociais, onde predominam imagens idealizadas de lazer, viagens e convívio, tende a acentuar comparações sociais negativas, o que pode comprometer o bem-estar subjetivo, reduzir a autoestima e intensificar sentimentos de exclusão (Verduyn et al., 2020). Embora possam, por vezes, motivar a auto-superação, na maioria dos casos geram um ciclo vicioso de comparação e frustração. Além disso, a desigualdade no acesso a recursos económicos e emocionais limita a possibilidade de participação em experiências consideradas típicas das férias de verão, reforçando o sentimento de exclusão face à narrativa dominante do “verão ideal”.

Estudos indicam que fatores pessoais, familiares e contextuais podem agravar a solidão em períodos de pausa escolar. O estudo de Stickley et al. (2016), conduzido com adolescentes em três países, identificou associações entre solidão, timidez, dificuldades sociais, bullying, baixo suporte parental, depressão e ansiedade. A investigação de Hu e Gutman (2021), realizada durante o verão pandémico, reforçou que o verão pode ser, por si só, um período de elevada vulnerabilidade emocional.

O impacto psicológico da solidão não se limita ao sofrimento subjetivo. Whitley (2021) destaca que a solidão é mais intensa na primavera e no verão, precisamente quando se espera que as pessoas estejam mais ativas socialmente. A solidão está também associada a mecanismos de stress crónico, como a ativação prolongada do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), alterações hormonais (ex. aumento do cortisol) e respostas inflamatórias, com consequências para a saúde mental e física. Segundo Pascalidis e Bathelt (2024), a solidão, constituída pelo isolamento e conectividade social reduzida, atua como um nó central nas redes de psicopatologia, contribuindo para a comorbidade entre diferentes perturbações.

Face a este panorama, a investigação científica propõe várias estratégias eficazes para lidar com a solidão nas férias. A promoção de conexões sociais, através de atividades comunitárias, voluntariado ou grupos de interesse, é uma forma válida de fomentar o sentimento de pertença. A manutenção dos vínculos afetivos existentes, mesmo à distância, via mensagens ou videochamadas, contribui para reduzir a perceção de isolamento. Práticas de autocuidado, como o exercício físico, a meditação e passatempos têm também efeitos positivos na regulação emocional. É necessário reformular as expectativas sociais impostas, especialmente nas redes digitais, reconhecendo que estas frequentemente apresentam realidades distorcidas (Turpin, 2023).

Quando a solidão se torna persistente e compromete o bem-estar psicológico, é essencial procurar apoio profissional para auxiliar na compreensão e manifestação desta vivência. Discutir a solidão nas férias é essencial para desmistificar e legitimar uma experiência muitas vezes invisibilizada. Só com uma abordagem sensível e baseada em evidência científica será possível promover o bem-estar psicológico de forma inclusiva, cuidando das pessoas não apenas nas rotinas do dia a dia, mas também nos momentos de pausa e silêncio.


"Solidão nas Férias - quando o silêncio pesa mais do que o descanso"

Referências

Hu, Y., & Gutman, L. M. (2021). Loneliness and life satisfaction among young people in the UK during the COVID-19 pandemic. International Journal of Behavioral Development, 45(6), 525–531. https://doi.org/10.1016/j.psychres.2021.114064

Pascalidis, J., & Bathelt, J. (2024). The “central” importance of loneliness in mental health: A network psychometric study. International Journal of Psychology, 59(5), 690–700. https://doi.org/10.1002/ijop.13133

Richardson, T., Elliott, P., & Roberts, R. (2017). Relationship between loneliness and mental health in students. Journal of Public Mental Health, 16(2), 48–54. https://doi.org/10.1108/JPMH-03-2016-0013

Stickley, A., Koyanagi, A., Koposov, R., McKee, M., Roberts, B., & Ruchkin, V. (2016). Loneliness and its association with psychological and somatic health problems among Czech, Russian and U.S. university students. BMC Psychiatry, 16, 128. https://doi.org/10.1186/s12888-016-0829-2

Turpin, C. (2023, 1 de agosto). O impacto psicológico da solidão no verão. Activa. https://activa.pt/emocoes/2023-08-01-o-impacto-psicologico-da-solidao-no-verao/

Verduyn, P., Gugushvili, N., Massar, K., Täht, K., & Kross, E. (2020). Social comparison on social networking sites. Current Opinion in Psychology, 36, 32–37. https://doi.org/10.1016/j.copsyc.2020.04.002

Whitley, R. (2021). Summer loneliness and mental health: The time to act is now. Psychology Today. https://www.psychologytoday.com/us/blog/talking-about-men/202104/summer-loneliness-and-mental-health-the-time-act-is-